sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Valquíria

 

                                 


Ali está ela, recostada, taciturna,
Misturando-se ao cimento enegrecido;
Valquíria.
Apenas Valquíria, Valquíria de nada nem de ninguém.
Nem filha fora, muito menos irmã!
Valquíria sem religião, sem compaixão...
Valquíria mulher.
Ela e sua boca vermelha, com seus olhos cinza e roupas justas,
Pernas amostras, carne exposta, esviscerada na calçada
Valquíria dos desejos, voluptuosa, com seus longos cabelos loiros, pele alva Como a lua, serpenteia libidinosa, quase nua, lânguida criatura, estuprando a rua com seus saltos a quebrar o silêncio.
Valquíria noctívaga, amiga das sombras, da madrugada,
Com seu cigarro a iluminar a escuridão.
Valquíria sem opinião e sem razão.
Mergulhada em um copo de bebida barata
A delirar utópicas fantasias etílicas.
Ébrias visões de Valquíria.
Valquíria da inconstância e da incerteza,
Da meia fina da quase seda.
Do perfume inebriante.
Valquíria da lágrima contida, da alegria perdida sem vida.
Valquíria que quando a lua se guarda e a madrugada se finda,
Vão-se embora as sombras com seus horrores
Sem maquilagem e com sonhos borrados,
Valquíria agora é Maria das Dores,
Nome de santa, para não tão santa sem valores.
Das Dores do cabelo desengrenhado, rosto insone.
Do pigarro irritante e do escarro tuberculoso na soleira...
Das Dores do barraco de porta única.
Mal afamada pela vizinhança hipócrita.
Das Dores órfã, sem resposta...
Do cinzeiro entupido de xepa de cigarros e
Garrafas a(ini)migas espalhadas no barraco,
Das Dores sem alma, sem amores.
Das Dores que, quando a noite enegrece o dia, volta a ser
Valquíria...
...Valquíria não menos sem dores!


                                                                    CRISTIANO MELLO

Nenhum comentário:

Postar um comentário